terça-feira, fevereiro 27, 2007

NICÉIA E A QUESTÃO ARIANA


Seguem algumas fontes sobre a Questão Ariana e dos Credos da Igreja Cristã. Os fragmentos foram tirados do livro do Bettenson e da Fernanda Espinosa que contam na bibliografia.


O CREDO DOS APÓSTOLOS – O “ANTIGO CREDO ROMANO”
Credo de Marcelo, bispo de Ancira, enviado a Júlio, bispo de Roma, c. 340. Marcelo, desterrado de sua diocese por pressões arianas, passou quase dois anos em Roma e, antes de sair da cidade, deixou este documento de sua fé. Mais tarde, Rufino, sacerdote de Aquiléia, Expositio in symbolum, c. 400, comprara o credo de Aquiléia ao de Roma, tomando-o como credo composto pelos Apóstolos de Jerusalém e conservado pela Igreja Romana. Difere do de Marcelo em alguns detalhes.

Creio em Deus onipotente [Rufino: em Deus Pai onipotente] e em Jesus Cristo, seu único Filho, nosso Senhor, que nasceu do Espírito Santo e da Virgem Maria, que foi crucificado pelo poder de Pôncio Pilatos e sepultado, e ao terceiro dia ressurgiu da morte, que subiu ao céu e assentou à direita do Pai, de onde há de vir para julgar vivos e mortos. E no Espírito Santo, na santa Igreja, na remissão dos pecados, na ressurreição da carne, na vida eterna [omitida por Rufino].



O CREDO DE CESARÉIA
No Concílio de Nicéia (325), Eusébio de Cesaréia, sugeriu a adoção do credo da sua própria Igreja, que é o que segue:

Cremos em um só Deus, Pai onipotente, criador de todas as coisas visíveis e invisíveis; e em um só Senhor Jesus Cristo, Verbo de Deus, Deus de Deus, Luz de Luz, Vida de Vida, Filho unigênito, primogênito de toda a criação, por quem foram feitas todas as coisas; o qual foi feito carne para nossa salvação e viveu entre homens, e sofreu, e ressuscitou ao terceiro dia, e subiu ao Pai e novamente virá em glória para julgar os vivos e os mortos; cremos também em um só Espírito Santo.


O CREDO NICENO
O credo de Eusébio era ortodoxo, mas não se opunha frontalmente à ameaça ariana, assim, foi aperfeiçoado pelo Concílio para que cumprisse esta função.

Cremos em um só Deus, Pai onipotente, criador de todas as coisas visíveis e invisíveis; e em um só Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, gerado pelo Pai, unigênito, isto é, da substância do Pai, Deus de Deus, Luz de Luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado não feito, de uma só substância com o Pai, pelo qual foram feitas todas as coisas, as que estão no céu e as que estão na terra; o qual por nós homens e por nossa salvação, desceu, se encarnou e se fez homem, e sofreu e ressuscitou ao terceiro dia, subiu ao céu, e novamente deve vir para julgar os vivos e mortos; e no Espírito Santo. E a quantos dizem: “Ele era quando não era”, e “Antes de nascer, Ele não era”, ou que “foi feito do não existente”, bem como a quantos alegam ser o Filho de Deus “de outra substância ou essência”, ou “feito”, ou “mutável”, ou “alterável” a todos estes a igreja Católica e Apostólica anatematiza.


OS ENSINAMENTOS DOS ARIANOS
Um historiador do século V, Sócrates, autor de uma História Eclesiástica que abrange o período de 324 e 439, expõe as doutrinas arianas, transcrevendo uma carta dirigida aos fiéis por Alexandre, bispo de Alexandria.

Os dogmas que inventaram e afirmam, contrariamente à autoridade das Escrituras são estes: Que Deus não foi sempre o Pai, mas que houve um tempo em que ele não era o Pai; que o Verbo Divino não existe desde sempre, mas que foi criado a partir do nada [...] pelo que houve um tempo em que não existiu, e, portanto o Filho é uma criatura e uma obra. Que ele não é como o Pai no que respeita à substância nem é o verdadeiro e genuíno Verbo Divino, ou a verdadeira Sabedoria, mas certamente uma de suas obras e criaturas, sendo abusivamente chamado de Verbo e Sabedoria, visto que Ele próprio foi feito pelo Verbo de Deus e pela Sabedoria que está em Deus, pela qual Deus fez não apenas todas as coisas, como a si próprio também. Por esta razão Ele é, pela sua natureza, mutável e susceptível de transformações, como todos os outros racionais o são, pelo que o Verbo é estranho a tudo que não seja a substância de Deus; o Pai é inenarrável e invisível para o Filho, porque nem o Filho conhece perfeita e exatamente o Pai, nem o pode ver distintamente. Com efeito o Filho não conhece a natureza da sua própria substância, porque foi criado por nossa causa, a fim de que Deus pudesse criar-nos por Ele, como por meio de um instrumento; nem Ele teria jamais existido se Deus não tivesse desejado criar-nos. [...]


TRECHO DE UMA CARTA DE ÁRIO À EUSÉBIO DE NICOMÉDIA

(...) não podemos dar ouvidos, nem mesmo pensar em debelar as heresias sem que nos ameacem de mil mortes. Nós pensamos e afirmamos como temos pensado e continuamos a ensinar: que o Filho não é ingênito, nem participa absolutamente do ingênito, nem derivou de alguma substância, mas que por sua própria vontade e decisão existiu antes dos tempos e era inteiramente Deus, unigênito e imutável.

Mas, antes de ter sido gerado ou criado ou nomeado ou estabelecido, ele não existia, pois ele não era ingênito. Somos perseguidos porque afirmamos que o Filho tem um início, enquanto Deus é sem início. Eis por que somos perseguidos, e também porque afirmamos que ele é do que não é, justificando essa afirmação, porquanto ele não é parte de Deus nem deriva de substância alguma. Por isso somos perseguidos, vós sabeis o resto.

Confio, caro Eusébio, fiel discípulo de Luciano, que permaneçais firmes no Senhor e lembrado de nossas aflições.

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